quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Bicicletas: por uma questão de princípio


Renato Muniz Barretto de Carvalho

Bicicletas no trânsito, mesmo que em situação de erro, devem ter nosso respeito e a preferência. Eu explico: depois da caminhada, as bicicletas representam a alternativa mais ecológica e saudável de locomoção que existe.

Bicicletas não fazem barulho, não soltam fumaça, pois não queimam combustíveis poluentes e não têm escapamento para gazes prejudiciais ao meio ambiente, ocupam pouquíssimo espaço, podem ser transportadas nas costas, empurradas morro acima e morro abaixo, em carrocerias, em suportes variados, podem ser guardadas em apartamentos, podem ser pilotadas por pessoas de todas as idades, desde que se tomem alguns cuidados básicos de segurança, dependendo do modelo, não custam caro... E o quê mais? Amplie a lista, acrescente mais uma qualidade deste veículo do futuro, fique à vontade.

Andar numa bicicleta pode ser um ato de muita elegância. Se não deixarmos o pé enroscar na corrente, pode-se andar numa bicicleta de calça fina, até de terno. Ajeitando-se bem a saia, ela não atrapalha. Deve-se, por questões de segurança, evitar o uso de sapato de salto alto, mas, cá entre nós, esse tipo de calçado faz mal à coluna.

Pode-se ir de bicicleta na panificadora, no supermercado, no banco, na escola, ao trabalho, ao cinema, onde puder e quiser. Você já viu alguma restrição às bicicletas? Algo do tipo: “proibido andar de bicicleta aqui”. Tudo bem que não se deve andar de bicicleta nas calçadas, nos passeios, pois isso pode incomodar os pedestres, pode machucar alguém, mas fora isso não há restrições. É claro que existem locais onde é inconveniente andar de bicicleta, por exemplo, nos corredores de um shopping ou de uma escola, mas nesses lugares todos existem estacionamentos apropriados.

Bicicletas não pagam taxas abusivas e injustas para circularem nas vias públicas. Delas não se exigem placas, nem carteira de motorista aos ciclistas. Não se cobra pedágio de bicicletas (tomara que continue assim, nunca se sabe até onde vai a sanha arrecadadora de certos políticos!).

Convencidos? Como cavalos, mulas, burros, búfalos, cabras, carros de boi, charretes e carroças não devem circular nas grandes cidades, a não ser em parques, grandes praças ou trajetos de trânsito mais livre, restam as bicicletas como alternativa saudável e ecológica.

Por tudo isso, devem ser protegidos, acima de qualquer lógica, os ciclistas, os bicicleteiros, os amantes da magrela, os que gostam das bikes. Então, se um menino abusado cruzar na sua frente de bicicleta, contrariando todas as regras de trânsito, respire fundo, diminua a velocidade, e deixe-o passar. Se uma bicicleta vai pela esquerda, ultrapasse com cuidado. Se você perceber uma bicicleta à frente, ou do seu lado, pense como o mundo e as grandes cidades seriam bem melhores se mais pessoas andassem de bicicleta, pense na poesia que é ir ao encontro da namorada de bicicleta, no quanto é bom poder curtir uma paisagem bonita no ritmo lento de algumas pedaladas. Entendeu? Concorda?

Renato Muniz é geógrafo, professor, escritor, diretor do CEA Sítio da Pedreira, e convida a todos para conhecerem, de bicicleta, a pé, a cavalo, ou de carro mesmo, o CEA Sítio da Pedreira, em Uberaba – MG. Mande um e-mail para sitiodapedreira@gmail.com ou ligue para (34) 9996-6843.

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quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Chuvas, trovoadas e o clima no Cerrado: modo de usar

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Renato Muniz Barretto de Carvalho

O Cerrado costuma ter dois momentos bem marcantes: um desses momentos é chamado de “tempo das chuvas” ou “tempo das águas”, geralmente vai de outubro a abril. Como o próprio nome diz, chove muito nesta época, com chuvas torrenciais, acompanhadas de muitos raios, às vezes tempestades, que derrubam árvores e assustam todo o mundo, bichos e pessoas. A temperatura esquenta, em alguns lugares os termômetros ultrapassam a marca dos 40 graus. A partir do mês de maio já esfria bem, as frentes frias do Sul começam a vir com força, e é quando chegam as chuvinhas finas, geladas, que convidam para o aconchego de um fogão de lenha.

A outra estação é a da seca, quando chove pouco, tudo fica amarelado, seco, é claro! As pastagens, os animais e as pessoas se ressentem por causa da baixa umidade. O tempo da seca, geralmente, vai de maio a setembro, às vezes se prolongam até outubro ou novembro. É quando acontecem muitos incêndios, o ar fica carregado de poeira e o céu, nos fins de tarde, adquire tons alaranjados, até vermelhos, com paisagens e flagrantes lindos.

Parece que a maioria dos habitantes dessa região não se acostuma com as mudanças e os ritmos anuais. Como alguns reclamam! No tempo das chuvas as pessoas comentam, preocupadas, que está chovendo muito, que a chuva “atrapalha” isso e aquilo. No tempo da seca é a mesma coisa, dizem que “nunca viram um ano tão seco” e outras observações curiosas, desencontradas, tão típicas, tão características nossas.

O tempo das chuvas traz preocupações com as enchentes, com os deslizamentos de encostas, mas é o tempo da fartura, das colheitas, das pastagens verdes. O solo vai ficar encharcado e as minas d’água – se choveu bem e elas estão protegidas por árvores, por matas, e se estão em refúgios adequados – vão abastecer os reservatórios, garantir a fartura de água nas cidades e o fluxo dos rios, córregos e riachos.

O tempo da seca traz outras preocupações, principalmente com as queimadas, mas o período sem chuvas facilita a lida no campo, pois permite que vários serviços sejam executados, permite que novas formas de vida apareçam e, de certa forma, há uma preparação para o próximo período. Se ninguém retirar ou colocar fogo, as folhas secas que caírem nessa época servirão como um importante componente de proteção para a vida do solo.

Em janeiro e fevereiro ocorrem os mais altos índices de precipitação pluviométrica. Costuma chover na metade dos dias dos dois meses, isto é, em 59 dias, 31 dias de janeiro e 28 dias de fevereiro, costuma ocorrer chuva em 30 dias ou mais. Se não vier o veranico, que é um intervalo sem chuva.

É bem diferente o que acontece em julho ou agosto. São meses secos, quando torcemos por um diazinho que seja de chuva, para aliviar a poeira e a sequidão.

No tempo das chuvas, a umidade toma conta de tudo. Às vezes, uma fina camada de mofo cobre os móveis de madeira. A roupa no varal demora a secar, os motoristas sofrem com as estradas cheias de buracos. Nas várzeas e nas encostas o medo toma conta dos mais simples, miseráveis e desafortunados. Até que as chuvas diminuem e, parece, tudo volta ao normal, sem nunca ter deixado sua normalidade, se é que a natureza tem uma norma, regras fixas. Se regras existem, não são tão rígidas quanto uns querem fazer crer. Não são.

O tempo da seca traz a possibilidade de finais de semana ensolarados e, se não esfria muito, permite ousadias nas refeições, banhos de rio e duchas deliciosas em cachoeiras escondidas. O ruim é que o tempo seco prejudica a pele dos mais sensíveis, o pó que se acumula nos móveis incomoda as donas de casa e afeta a saúde dos alérgicos. Os hospitais ficam cheios de crianças com problemas respiratórios.

Nesse período, os governos e todos nós deveríamos ficar atentos para impedir e denunciar as queimadas, o desmatamento e a poluição do ar e dos cursos d’água.

O melhor de tudo isso é saber que um dia a seca termina, que a chuva volta, que o nível dos rios sobe novamente. As árvores se enchem de folhas verdes, os pássaros cantam bastante e constroem, frenéticos, seus ninhos.

Mas, é no mês de abril que o tempo nos reserva sua melhor surpresa. A paisagem ainda está bem verde, mas as chuvas diminuem. Então, aproveite para se deitar num gramado à sua escolha, num local seguro, de preferência bem cedo, ou de tardinha, e tente ouvir o coração da Terra bater. Feche os olhos, relaxe, deixe as preocupações de lado um pouco e perceba que você faz parte deste imenso e belíssimo mundo. Se você se sentir confortável, durma, e acorde só de noite, quem sabe com a sorte de ter uma estonteante e linda Lua cheia despontando no horizonte.

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